Hábil, nadou pelas profundezas, emergiu das águas frescas e convidativas do rio. Sua pele bronzeada brilhava sob os raios escaldantes e dourados daquela manhã de sol, acentuando seus músculos. Gotas de água grudadas em seu peito traçavam caminhos por seu abdômen teso e desapareciam no cós de sua curta sunga, cujo tecido molhado grudava firmemente em seu corpo, revelando cada curva e contorno de seu físico. Enquanto ele caminhava confiante em direção à margem, seus músculos ondulavam e flexionavam sob sua pele, irradiando uma aura de poder e sensualidade crua. Seu cabelo ruivo emoldurava seu rosto que trazia um leve indício de sorriso travesso. Ao chegar à margem, ele parou por um momento, seus olhos castanhos-claro ainda examinando o derredor — até onde a vista alcançava, a cachoeira fervilhava de banhistas. A visão nele era hipnotizante, difícil não sentir a atração magnética de sua energia. Finalmente se virou para subir ao prado, cada passo chamava a atenção daqueles ao seu redor.

Boquiaberta:
“Uau…”, disse Hannah, olhando através de um binóculo a protuberância na suga dele. “Puta que pariu, isso foi melhor que todas as saídas do mar MAIS SENSUAIS na história do De Férias Com O Ex! Tô passando mal, Naimô… me segura…”
Arrepiadíssimo, Naimoân sentia uma vibração no seu corpo. Eram férias escolares, e neste momento encantou-se, experimentava um otimismo quente crescer em seu peito.
“Quem é ele, Hannah?”, perguntou.
“Nem te conto, Naimô… eu sou ótima em stalkear, mas esse daí… nem precisa.”

Apesar de sua aparência ter mudado bastante, ele não era um total desconhecido, “é de cair o prego da havaiana, ele foi do lixo ao luxo”, Hannah o qualificou. Era verídico, Francis estava de volta a sua cidade natal, seus primos confirmaram o babado.

Uma vez expulso, primeiro só mudou de escola, mais tarde, ocasionalmente, seus pais deixaram Altas Nascentes.
O engraçado é que uma história de um tal de trabalho de biologia queimado rendeu muitas alterações, com uma versão final assustadora. Total ideal para boca e ouvidos do povo… Mais ou menos assim:

Páginas e páginas de trabalho manuscrito e digitado, cartazes muito bem elaborados e maquetes belíssimas do grupo supostamente considerado rival de Francis… Estamos em um beco escuro e solitário, Francis — na época quase treze anos —, acende um fósforo e o deixa cair num grande latão — a cena tinha nuances cinematográficas, o palito de fósforo caindo em câmera lenta até que — e as chamas emergem. “Ninguém vai fazer um trabalho melhor do que meu grupo!” Risadas malignas assustadoras foram feitas, folhas e cartazes rasgados, maquetes pisoteadas e por fim tudo jogado no fogo.
Bizarro, não é? Essa foi a versão final da história que até hoje repercutia na cidade. Não foi bem desse tipo que as coisas aconteceram… Sim, o trabalho foi roubado, rasgado e incendiado, só que não foi apenas o Francis, foram quase todos de um grupo de sete alunos. No fim do escândalo, Francis se autoresponsabilizou por tudo, isentando o restante.

O hiato de Francis em Altas Nascentes foram quatro anos de —

Ao passar o olho no errôneo sumário do livrete, Francis enrijeceu a intolerância, o vigésimo tópico “Homossexualismo e Lesbianismo” estava destacado.

‘Alguém que talvez esteja interessado no bem-estar da sua alma lhe deu este livrete […] Você pensa que esta mensagem lhe chegou às mãos por simples acaso? Pensa que Deus não está realmente interessado em você — em como vive e em que pensa? Tire esta ideia da cabeça. Todas as forças do céu estão sintonizadas em sua direção. Você está sob a influência do derramamento do Espírito Santo e deve encarar a realidade de frente! Quando o Espírito Santo agir, é chegado o momento de reagir — de entrar no reino de Deus.’

O professor — muito bem conhecido — pai de família e obreiro da igreja, foi quem pôs o livrete nas mãos de Francis. Deixou claro ser uma relíquia, “me devolva assim que você terminar de ler. Tenho certeza que vai te ajudar, meu jovem”, disse.

Voilà, mais uma obra para conta. Inteiramente incendiada.

Os pais, além de obrigá-lo ir à igreja, forçavam-no a ler versículos bíblicos:

“Com homem não te deitarás, como se fosse mulher; é abominação.”
“O homem que se deitar com outro homem como se fosse uma mulher, ambos cometeram uma abominação, deverão morrer, e seu sangue cairá sobre eles.”…

Adivinha? Outra obra para conta. Na primeira oportunidade o livro bíblico foi reduzido a cinzas.

Tiraram dele o celular e laptop, não o deixava nem mais receber amigos em casa. Como ele mesmo diria mais tarde, “abriram-se as portas do inferno” na vida dele. Frente à porta do quarto dele, sua mãe fazia questão de ajoelhar-se para orar em voz alta, com pesadas palavras contra aquilo que ela considerava uma doença; traziam o pastor para orar pelo filho, fazer o ritual de benzê-lo e o aspergir com água benta.

O pastor falava: “Seus pais amam tanto você. Você quer mesmo ser essa coisa? Ser este peso pra eles, ser esse fardo na vida deles?”

Francis se trancou quando escutou que chegavam várias pessoas na sua casa, ele conhecia as vozes — eram membros da igreja e parentes — algo estranho estava acontecendo —, alguém, lá fora — no quintal — deu três toques na janela do quarto dele — e

Francis. Vem cá, estamos aqui para te ajudar, pra tirar isso de dentro de você.

Negou.

Parte deles foram para o quintal da casa — frente a janela do quarto — e a coisa toda começou… os gritos, as pisadas fortes no chão, o espalmar nas paredes, na janela e também na porta do quarto. Sons estranhos eram produzidos, as referências a espíritos e demônios homossexuais foram proferidas:
“Você, abominação aos olhos de Deus! Demônio do homossexualismo,levanta-te e saia daqui. Você, demônio, perca-se! Demônio do sexo, sua cobra!
As pessoas lá fora eram ungidas com óleo de rosas, encharcadas com água benta, e as orações de exorcismo cantadas; cada etapa invocava reações selvagens dos membros, de gritos de agonia a cair no chão em ataques de convulsões.

“Liberto-o dessa maldição! Saía desse corpo que não te pertence! Deus, eu o clamo para libertar esta alma aflita, senhor. Todo-poderoso, não o deixe trocar de sexo! O liberte, senhor!”, gritava um que garantia expulsar o demônio do alvo do seu exorcismo, erguia uma cruz de madeira em direção ao quarto.

Talvez todos ficaram bastante irritados, porque Francis não apresentou nenhum sinal de possessão…

Francis pensou que aquilo nunca iria acabar, foi a primeira vez que desejou morrer, sentou no chão e chorou com a cabeça afundada em meio aos joelhos, não via a luz no fim do túnel.

Um dia depois, pedalou até o conselho tutelar, foi então que começou a recuperar sua voz.

Francis escutou de um cara que fazia entrega de pães na zona-rural que sempre via dois homens caminhando juntos bem cedo pela manhã — um deles era quem lhe emprestou o livrete —, parecia ser uma atitude incomum, e ao retornar das entregas, os dois homens desapareciam, “só se eles forem o flash pra andar mais rápido que meu fusquinha.”, comentou o entregador da padaria.

Com o caso investigado, Francis ficou um mês arquitetando tudo, pegou o número de todos os comércios da cidade, conseguiu quase todos os números dos alunos da escola de lá e juntou todos os contatos dos membros da bem dita igreja.

* * *

A camisa toda desabotoada; os mamilos e — abra-te sésamo —, seu ponto principal de prazer, imploravam para serem estimulados. Era um domingo, Francis estava sozinho em casa, assim dispunha de nenhum eufemismo…

Um polegar sobre a tela do celular e outro sobre a sua cueca branca úmida de suor e gotejada por seu líquido pré-ejaculatório. Fez uma pausa, escolheu pensar um pouco mais sobre aquilo, enquanto seu pau enrijecia e o suor descia pelo seu desnudo corpo. Olhou para a almofada que estava ao seu lado no sofá e a almofada o encarou de volta, ela seria comida pelo seu… que latejou em resposta, mas algo — comendo-o com os olhos — era mais suculento, alongado e sulcado…

O corte foi manhoso.

Francis percebeu que o núcleo avermelhado e violeta pálido lembrava não só a mucosa de um ânus como também aquilo que proporciona vida e força ao corpo — os músculos. O afiado cutelo, manuseado num corte longitudinal, deixara expostos, servindo ambas simétricas partes ao confronto de diferenças e semelhanças, os cotilédones que nutriam e sustentavam a promessa oculta do cacau, oferecendo os sabores profundos e as riquezas que se revelariam quando cuidadosamente despertados; contudo, ele não estava interessado naquilo. Após dissipar um pedaço de uma das extremidades do alongado cacau — onde algumas sementes foram cortadas ao meio, expondo os análogos cotilédones —, ele removeu, deixando o fruto oco, as ovoides amêndoas recobertas por uma polpa branca gelatinosa; largou-as sobre a tábua de corte onde o cutelo permaneceu cravado, e da cozinha voltou para a sala com o oco cacau em mãos.

Seu interior era macio e firme e finalmente seu pau deslizava dentro dele, arregaçando seu aconchegante interior apertado, pensava em ninguém e em toda uma geração antes dele, incluindo o infértil cacau, que não fazia ideia do que estava acontecendo, apenas entendia que tinha que deixar acontecer e, no fim, talvez sentira o prazer do ato. Aquilo o excitou tanto que o orgasmo… Francis sentiu que podia parar naquele instante ou, com mais um único movimento, gozar, foi o que acontece: com cuidado, deixou gemidos escaparem enquanto derramava seu sêmen no núcleo esbranquiçado do cacau — devolvendo-o a felicidade, certamente também sentira prazer.
Inclinou o corpo para trás, segurando a fruta com as mãos, grato por não derramar no sofá.
O contente e inseminado cacau, tentando não ceder o que foi deixado dentro dele, deitou sobre a invejosa almofada.
Ainda arfante, Francis, com o dedo, brincou com o conteúdo ainda viscoso dentro do fruto. Pensou a respeito das milhares de possibilidades de vida nadando lá dentro. Assistiu, ainda mais curioso, o interior do cacau e rapidamente se viu cada vez mais estimulado sobre os sabores e sensações que logo encheram sua boca.

Seu pau reergueu-se.

Durante a degustação do recheio — enquanto se lamentava o cacau —, seus pensamentos se voltavam para as gerações que vieram antes dele, desde seu tataravô e além, remontando aos séculos e cruzando os continentes, todas as contribuições que trouxe a sua existência, inúmeras ejaculações dos seus antepassados, cada um deixando um rastro de si no mundo, todos reduzidos a sua própria genética na qual sua língua banhava-se naquele momento. Foi um pensamento avassalador, batia um senso de responsabilidade em honrar a contribuição deles para sua existência, mas — ao mesmo tempo — sentiu o despertar das faíscas da rebeldia. De olhos fechados, se concentrou naquele sabor profundo, na textura, na sensação… apesar, não era realmente sobre o gosto, mas sobre o ato em si — o desafio —, a recuperação do seu próprio corpo e identidade e, como um lembrete de que estava no controle da sua própria vida, engoliu. Subiu uma sensação de poder e de libertação de quaisquer ínfimas noções.

Soltou um suspiro e moldou um sorriso malicioso. A sua vida não valia nada e era uma vergonha até conseguir gritar alto eu sou o que sou! Calçado com um salto-alto da sua mãe, desfilou ao som de —

Neste ápice, Francis espelhou remotamente no telão da igreja uma gravação que fez do dono do livrete sendo fodido no meio do mato pelo seu colega de caminhada; também enviou o vídeo para um número absurdo de pessoas.

©   •  Timothée Zendi
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